quarta-feira, junho 12, 2013

O DIA EM QUE UM SUPER-HOMEM MORREU...

A memória ainda é bem viva em minha mente. Eu, como toda criança em seus seis-sete anos, achava o Jornal Nacional muito chato. Todas aquelas notícias sérias e sem graça sobre política e crimes... Muito entediante! Preferia ficar brincando com meus bonecos em lutas imaginárias e aventuras sem fim... E foi num dia assim, enquanto passava o Jornal Nacional e eu brincava com meus bonecos, que tudo aconteceu...

Imagine o meu espanto - eu, um adorador de HQs - quando ouvi a voz do William Bonner, - tão acostumado a falar nomes como Collor de Melo e Lula, entre outros... - de repente, citar o nome "Superman"... Eu pensei... Quer dizer, não sei o que eu pensei na hora... "O Superman está morto. Foi lançada, provavelmente, a história em quadrinhos mais importante do século: A Morte do Superman. O maior ícone dos quadrinhos encontrou seu fim. A notícia teve repercussão em todo mundo." (O que ele disse foi mais ou menos assim... Lembrar cada palavra é querer demais...).

Eu, sinceramente, não sei o que foi estarrecedor: se a notícia de que o maior super-herói dos quadrinhos, o invencível Superman, havia morrido ou se o fato do William Bonner estar falando de quadrinhos em pleno Jornal Nacional como se fosse uma daquelas notícias sérias de que alguma personalidade importante do mundo business fora assassinada. Foi bem chocante!

A Morte Do Super-Homem lançada pela
Abril Jovem com a capa metalizada
e o símbolo sangrento.
Lançada em 1993 sob a batuta criativa de Dan Jurgens, Roger Stern, Louise Simonson, Jerry Ordway e Karl Kese; A Morte Do Superman foi a história inicial de um arco que envolveria os principais personagens da DC Comics nas subsequentes Funeral Para Um Amigo e O Retorno Do Superman (ou Super-Homem, como foi lançado pela Abril Jovem), e teria consequências até mesmo na queda de Hal Jordan, o Lanterna Verde. Com cobertura mundial da mídia jornalística (como, por exemplo, o já citado Jornal Nacional), A Morte Do Superman pode até não ser uma obra-prima de roteiro (com vários furos de continuidade), mas é, com certeza, uma das histórias em quadrinhos mais importantes e influentes já publicadas.

Tudo começa com uma estranha criatura se libertando de uma prisão subterrânea. Confinado em uma roupa de aprisionamento, o ser demonstra grande força ao causar um imenso rastro de destruição com uma das mãos amarrada nas costas! Logo a Liga da Justiça - com uma formação bem diferente da equipe clássica - é acionada para deter a criatura. No entanto, sem a presença do Superman, todos são facilmente rechaçados pelo ser monstruoso, que recebe a alcunha de Apocalypse pelo Gladiador Dourado quando este se encontra ("se esbarra" seria mais apropriado!) com o Superman. Neste momento, o Super entra na briga. Uma looonga batalha que se estende pelos quatro números seguintes da minissérie, culminando na emocionante morte do maior herói do mundo. Sim, este é o mais que simplório roteiro de A Morte Do Superman.

O funeral para um amigo...
O que mais chama a atenção na minissérie talvez nem seja a história em si (que é bem fraquinha), mas a metáfora que o escritor Dan Jurgens elaborou sobre ela. Para entender essa figuração é preciso conhecer as intenções por trás da própria história.

É fato que a década de 90 foi, para os quadrinhos, os anos de personagens sarados, violentos, de histórias rasas e muitas cenas de ação impactante. Foi a famosa Era Image e a ascensão de desenhistas como Rob Liefeld e Jim Lee, especialistas em desenhar figuras musculosas e/ou gostosas. Com a popularização desses personagens, especialmente dos anti-heróis (os personagens nada politicamente corretos, que faziam justiça à sua maneira - a maneira mais violenta possível), os grandes ícones, os heróis escoteiros, como o próprio Superman, eram vistos como ultrapassados, e suas atitudes altruístas passaram a ser chacotas.

A Morte Do Superman é, ao mesmo tempo, a resposta crítica a esses "novos tempos" e a tentativa de revitalização do Superman diante desse novo cenário nos quadrinhos. Nas entrelinhas da história, Dan Jurgens faz uma clara crítica aos novos personagens da moda, à violência gratuita de suas ações (especialmente demonstrada na motivação do Apocalypse - a encarnação desses personagens - : a criatura nada quer, apenas a destruição pura e simples). Mesmo o desenrolar do roteiro: como disse antes, a maior parte da história é apenas cenas da batalha entre o Superman e seu algoz. Coisa que se tornou comum nas HQs da época.

O último adeus...
As cenas finais da batalha são todas em pin-ups de páginas inteiras, mostrando os dois combatentes já exaustos da extenuante luta. Em um dado momento, Lois Lane questiona a um Superman ferido sobre como parar o monstro. O herói responde que ele precisaria ser mais selvagem como nunca foi. A repórter rebate afirmando que ele, Superman, não é assim. O kryptoniano, então, afirma que para vencer este novo tipo de inimigo ele precisaria ser.

Trazendo para fora da metáfora, o que eu entendo desta cena é que os velhos heróis, com seus códigos de conduta e tudo mais, já não podiam fazer frente à nova leva de personagens violentos, de anti-heróis que resolviam tudo na selvageria. Era necessário ser tão selvagens quanto eles, se quisessem se manter no mercado editorial.

Aquela história marcava o fim de uma era. O fim de um tipo de super-herói: o incorruptível. A partir dali, o próprio Superman seria diferente, mais violento, mais humano. Alguns caminhos tomados pelos roteiristas nem foram de todo mal, afinal humanizar o Superman foi a melhor medida para torná-lo mais carismático frente a um mundo que já não acreditava no Bem como algo supremo e imbatível. No entanto, também era o sintoma de uma sociedade mais violenta e menos nobre, que adorava heróis igualmente assim. Heróis que defendiam um Bem superior, enobrecedor, entregue e capaz de se sacrificar por qualquer coisa já não eram a moda. Eles precisavam ser tão selvagens quanto seus inimigos se quisessem vencê-los a partir de agora.

O dia em que um super-homem morreu.

O Superman deixou de ser o herói que era para se adaptar ao novo modelo que o mercado editorial exigia: menos ideais, mais músculos. Naquele dia, um Superman morreu. Nasceu um outro muito mais adequado aos nossos sangrentos tempos...

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